
Minha ficção, entretanto, fala mais de mim do que minhas memórias: a dentadura de meu pai escapando da boca ao me dar um beijo de boa noite, o corset de renda, cheio de ganchos nas costas que minha mãe usava em dias de festa, o cheiro da cama deles e o rádio ligado de manhã. A bandeja na cama e o barulho do meu pai tomando café pelando, a morte de minha avó Dina, o casamento do meu padrinho, as missas aos domingos.
Minhas tias e tios que eram velhos e tinham sotaques, contavam casos, discutiam. Às vezes tinham paciência comigo, às vezes eu sabia que estava atrapalhando e ficava emburrada no canto. Da rejeição ao amor extremo, assim cresci no meio de adultos quase normais, estranhos às vezes, fascinantes sempre. Entre salas de visitas e quintais, festas e funerais, fui catando conchinhas de relatos, pescando nesgas de sentimentos e tentando entender quem eram meus pais, os pais deles e os pais dos pais deles.
Quero saber quem sou eu no meio dessa avenida por onde tenho desfilado com certa galhardia? Além do DNA, o que me fez ser quem eu sou?
3 comentários:
Belo texto, San! Repleto de tudo aquilo que conversamos no café. Será mesmo uma crônica ou é o primeiro capítulo de um livro?
Essa é a dúvida, Paulo... bjs san
Ó Sandra: não se pergunte quem vc é pois vc acabou de descrever-se naquelas lembranças...desde que eu te conheço vc sempre foi o extrato de sua familia, tão presente ela é mesmo agora que já longinqua...
É o seu caminho já traçado, ser o reporter de uma estirpe!
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