07 novembro 2015

Llíngua de prego

Agora você está entrando no Café do Zé.
Fique à vontade, puxe uma cadeira.
Boas histórias ordinárias o aguardam.

- Eu quero um café, expresso, meio carioca. Meio carioca é assim: com um pouquinho só de água quente. Dá para colocar espuma de leite? O leite é integral? Ah, então deixa. Pode ser sem espuma. Tem açúcar mascavo? Ótimo! Por favor, quero o café servido em xícara seca, se você não se importa. Detesto xícara molhada, muda o gosto do café, sabe? Você pode levar até a mesa? Estou esperando uma pessoa. Dá para limpar essa mesa aqui? Está suja. Obrigado.

O homem elegante e impecavelmente vestido puxa a cadeira, senta-se e abre o jornal com cuidado. Mal começa a ler e olha para cima, depois para os lados. Quando Zé vem com o café, ele pede para mudar de mesa porque ali onde estava havia uma corrente de vento. Muda-se para um lugar mais reservado perto do balcão e diz que a música estava atrapalhando sua leitura. Zé, tentando ser gentil, diz que vai tomar providências e resmunga qualquer coisa ao entrar para a cozinha.

O executivo toma seu café devagar. Pede uma água mineral, garrafa pequena, sem gás, com uma pedra de gelo, suco de limão à parte e um copo seco, por favor. Detesta copo molhado. Reclama que agora a música estava praticamente inaudível. Sim, dava para aumentar o som, resmunga Zé.

Quinze minutos depois, entra uma moça de cabelos roxos espetados, unhas azuis, umas vinte argolas de metal em cada orelha e várias roupas pretas sobrepostas. Vai direto à mesa do homem bem vestido e o beija. Na boca. Demoradamente. Senta-se ao lado dele e sorri com cara de alcova. Ele disfarça. Ela contorna todas as reentrâncias da orelha esquerda dele com a língua de prego. Depois, segura seu rosto com as duas mãos e repete o gesto na orelha direita. Ele abre os olhos e sorri totalmente enfeitiçado pelos olhos verdes da exótica...


- Mais um café, expresso, meio carioca.



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