Viajar era
emocionante, mas foi ficando cansativo. Uma das poucas vantagens de estar
num avião é poder ficar sem fazer absolutamente nada por algumas horas.

Agora vejo as montanhas, com a neve branquinha que persiste nos cumes, lembrando um bolo de
chocolate amargo polvilhado com açúcar de confeiteiro. Admiro o cenário e, nas montanhas, vejo a nova face da velha solidão. Das
outras faces, conheço o medo de estar só, o vácuo de estar entre as pessoas que
não mais me amam e que eu não amo mais, o vazio dos que se foram, a solidão das
grandes decisões. Em segundos, vejo todas as faces fazendo parte de minha existência.
Sobrevoando as montanhas do Colorado procuro gravar o momento, esta nova face que assusta e atrai dissolvida em fumaça. É bela, é uma
solidão abençoada que me mostra que sou só, mas faço parte deste grande todo,
onde os detalhes desaparecem nas nuvens.
Quanto tempo eu perdi com eles, que me
deram uma identidade que eu não precisava ter e que absolutamente não me
pertencia! Agora eu simplesmente sou.
Neste momento, a paisagem é
lunar. As nuvens de carneirinho se confundem com as montanhas cobertas de neve.
Não me lembro de ter visto nada parecido. Flocos de algodão doce e açúcar de
confeiteiro...Sou meu pai e minha mãe, meu irmão e minha irmã, meu marido e minha
esposa...Eu sou.
Da janela, vejo apenas fumaça e luz. Paz é o deleite de estar só. Sinto cada
parte do meu corpo: mãos ressecadas, cabelo despenteado, narinas
dilatadas pelo ar pressurizado, mão e braço adormecidos, pernas inchadas e o coração em paz. Sinto-me só, deliciosamente só.
Nenhum comentário:
Postar um comentário