07 junho 2008

Memórias de Família

Receitas

Uma boa lembrança é a visão de minha mãe, toda arrumada, subindo a escada com uma bandeja e um prato de bananas cozidas, com canela e açúcar. Com seu ligeiro sotaque dizia: “Te fiz banana cozida para levantar as forças. Banana tem potássio, faz bem. Come tudo, vai, pra ficar boa.” E aquele aroma delicioso de canela invadia o quarto, enquanto eu comia a tal da banana, quentinha e doce. Essa receita me fez bem enquanto minha mãe viveu e cuidou de mim. Ainda faço banana cozida para cuidar de alguém que quero bem.

Tenho ainda uma sensação de ver minha avó, mexendo a polenta no fogo e dizendo para eu não chegar perto do fogão. Às vezes espirrava um pingo amarelo, fervendo e eu pulava para trás. Pensar na carne moída com molho de tomate caindo sobre a polenta e o parmesão ralado na hora ainda dá água na boca.

Aprendi com minha mãe um tipo de risoto, feito com sobra de arroz, para comer nos dias de tristeza ou cansaço. Coloca-se um pouco de leite na panela, dissolvido em um pouquinho de maizena, para engrossar levemente. Acrescenta-se sal, uma pitada de pimenta do reino, uma pitada de nós moscada. Quando ferver, acrescentam-se as sobras do arroz, mussarela picada, parmesão ralado. Come-se bem quente, com mais parmesão por cima. Faz bem para a alma.

Tudo que sei da cozinha árabe, aprendi com minha tia Loris, irmã de meu pai. Eram raros os momentos em que ela não estava na cozinha, pois, desde pequena, foi o que mais ela teve de fazer. Depois de casada, com cinco filhos e marido exigente, cozinhar era sua rotina. Eu me encantava ao vê-la preparar um panelão de charutinhos de folha uva, todos arrumadinhos em camadas. O cheiro de especiarias na cozinha era delicioso. Eu adorava roubar um ou outro charutinho, quando ela não estava olhando. À mesa, enquanto eu saboreava seus quitutes, ela dizia “Coll habib, coll... sahténn”, ou seja “come querida, come…saúde”.

Cheguei a aprender fazer folha de uva, mas fiz uma única vez, dá muito trabalho. Em compensação sei fazer quibe, esfiha, arroz marroquino, coalhada fresca e seca (atualmente compro pronta, porque é mais fácil) e tabule. O que preparo melhor é o arroz com lentilhas, mjadra. Dizia meu pai que era o mais saboroso, melhor do que o preparado por sua querida irmã. Eu sempre tive orgulho disso.

A comida árabe é ritualística, tudo dá muito trabalho e exige um tempero especial. Para fazer o arroz com lentilhas separa-se uma xícara de lentilhas e meia xícara de arroz. Coloca-se a lentilha para cozinhar e quando estiver mais ou menos cozida coloca-se o arroz junto, na mesma panela. Enquanto isso, corta-se três cebolas grandes em fatias bem fininhas. Em uma frigideira grande, coloca-se azeite de oliva e frita-se a cebola até ficar bem corada. Coloca-se uma colher desse azeite com cebola frita na panela em que se está cozinhando o arroz e a lentilha, para dar sabor. Acrescenta-se o sal. È bom não colocar muita água no cozimento, porque o arroz e a lentilha devem ficar sequinhos. Deixa-se descansar um pouco na panela, depois se despeja em um prato, com a cebola frita e o óleo por cima. Pode ser comido quente ou frio.

Cozinhar é um ato de amor!

Nenhum comentário: